"Muita gente não se sente à vontade para conversar com amigos e familiares porque nem todo mundo sabe ouvir sem julgar, sem fazer críticas. Nós tentamos respeitar as pessoas e por isso elas se sentem mais acolhidas. É o tipo de trabalho em que, na maioria das vezes, a gente não tem uma segunda chance. Você tem que acertar de primeira", explica Karina Soares, coordenadora de divulgação do CVV-PE e monitora do curso de seleção de voluntários. A administradora é uma das voluntárias da instituição há três anos. Toda semana ela reserva quatro horas e meia do seu tempo vago, após o expediente do trabalho, para conversar com pessoas que se sentem propensas ou determinadas a praticarem suicídio.
O atendimento telefônico funciona 24 horas, enquanto o atendimento pessoal é realizado de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, na sede da instituição, localizada na Avenia Manoel Borba, n° 99, sala 102, Boa Vista, Centro do Recife. Os candidatos a voluntários precisam passar por nove aulas, durante dois meses e meio. Durante o curso, os monitores identificam quem tem perfil para ser voluntário. Cada um escolhe o horário em que pode participar do plantão, mas também é necessário ter disponibilidade para participar dos cursos oferecidos pelo CVV e das reuniões de grupo.
Neste mês, o CVV completou 48 anos de existência no Brasil. Em Pernambuco, a institução, que não tem vínculo religioso, começou a funcionar em 1983. Atualmente, o CVV-PE conta apenas com 39 voluntários, número bastante inferior ao necessário para atender a demanda. Desse total, 30 são plantonistas.
A próxima turma de voluntários já começa a ser avaliada e treinada neste sábado (20), das 14h às 17h, na Rua Fernandes Vieira, nº 190, Boa Vista. Quem se inscrever após o dia 20 vai ser convocado para participar da seleção assim que tover início um novo curso.
Confira alguns trechos da entrevista com Karina Soares, coordenadora de divulgação do CVV-PE, para entender um pouco do trabalho dos voluntários:
Qual o perfil das pessoas que procuram ajuda no CVV? Qual a média de ligações?
Ligam crianças, adultos e idosos, homens e mulheres; tem de tudo. Nós não temos como traçar um perfil com dados exatos porque não anotamos nada sobre quem liga para assegurar o sigilo. Por dia, temos uma média de 100 a 120 ligações.
Normalmente as pessoas ligam quando já estão quase no ato ou costumam ligar antes de chegar a esse ponto?Alguns ligam no meio do ato, o que é bem mais difícil de reverter. Mas isso é mais raro. No caso dos idosos, por exemplo, o mais comum é ligarem pessoas cujos familiares não têm muita paciência para ouvir. Nesses casos o problema está mais ligado à solidão, abandono por parte dos filhos, que muitas vezes não sabem lidar com a velhice. Um dia atendi uma criança pedindo que ajudasse a mãe dela, que havia sido demitida. Ela disse que viu o telefone do CVV na televisão e perguntou se eu não podia falar com ela pra ajudá-la.
Há muitos casos de trote?
Às vezes tem trote, mas mesmo nesses casos a gente não trata como trote porque se a pessoa escolheu passar um trote para um centro desses é porque também deve estar precisando de ajuda. No mínimo, as pessoas que ligam estão precisando de companhia.
De que forma vocês ajudam?
O trabalho da gente não é psicoterapia, simplesmente damos apoio emocional. A gente não dá a saída, mas faz com que a pessoa fique mais calma e reflita. Não podemos dar conselho, não podemos ter uma solução. Vai que eu dou um conselho, a pessoa segue e dá errado! Nosso trabalho é baseado na tendência atualizante do ser humano - todo mundo tende a crescer, você tem potencial para achar a solução para os seus problemas, não sou eu que estou de fora que vou achar.
Depois de ouvir tantos problemas, vocês não saem abatidos ao final do plantão?
Não saio abatida, muito pelo contrário. A sensação é de que você é capaz de fazer a diferença entre a vida e a morte. Mas claro que precisamos estar bem para poder atender. Pra gente, é um crescimento pessoal tremendo. você aprende a aceitar as pessoas como elas são.
Como vocês não anotam o nome e o telefone de quem liga, como vocês sabem se a pessoa realmente ficou bem após a conversa e desistiu de chegar as vias de fato?
Realmente não tem como ter um retorno. Às vezes nos perguntamos: será que ajudei? Será que não ajudei? No curso de seleção, a gente se prepara para lidar com essa questão de não ter retorno. Algumas vezes, a pessoa liga chorando, desesperada e, no final da ligação, já diz que está melhor e nos agradece. Outros ligam depois para agradecer, para dizer que ficaram bem depois da conversa. A gente trabalha para não esperar retorno, para ter a consciência do dever cumprido.
E que perfil vocês buscam nos candidatos a voluntários?
Nosso crivo é muito forte. Mesmo estando precisando de mais voluntários, nós fazemos um filtro grande em relação ao perfil. A pessoa tem que ser discreta, não pode ser alguém que vai ouvir o relato e vai reproduzir, já que a questão do sigilo pra gente é muito séria. Nós mantemos em sigilo não só o nome de quem liga, como também a identidade dos voluntários. A triagem já é feita no curso de seleção de voluntários. Ao longo das nove aulas a gente vai identificando quem tem perfil pra ser voluntário.
CVV-PE
Endereço: Avenia Manoel Borba, n° 99, sala 102, Boa Vista, Centro do Recife.
Telefone: (81) 3421-7311/141
E-mail: recife@cvv.org.br.
Site: www.cvv.org.br
Do JC Online
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